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quarta-feira, 8 de julho de 2020



"A Chamada"

Alguns dias atrás me fizeram a seguinte pergunta:

Quando, onde e quem criou a chamada do passo a dois?

Como ela surge na arte?

Como não sei todas as respostas, além de me propôr a buscar tal resposta, confesso que eu mesmo, tive aguçada minha curiosidade, então sai em busca da mesma. Perguntei pra muitos mestres amigos e outros nem tanto, muitos como resposta descreveram o ritual em si, falaram de ser teste de conhecimento, malandragem, outros falaram de ancestralidade, outros ou por não saber ou não querer dividir o conhecimento de forma gratuita, mandaram eu buscar com meu mestre, enfim... Mas de todas as explanações a que me deu maior sentido para a dita pergunta veio do amigo Mestre Ribas, de quem sou fã e não nego, pois assim como eu busca mesmo as respostas e questiona também, alias o mestre se prontificou a explanar sua opinião a cerca do assunto de pronto, então sem mais delongas, neste momento volto a agradecer o mestre e venho postar na integra, sua explicativa escrito pelo próprio mestre:" Salve, Jimmy. 
Vou tentar sintetizar sem omitir informações.
Pra começar, nunca encontrei quem me desse uma explicação que me satisfizesse para legitimar as chamadas de bênção. E eu procurei respostas, inclusive, com mestres renomados da velha guarda da Bahia... Tudo que encontrei foram especulações e achismos, sempre associados à religião ou à necessidade de disfarçar a luta. Daí, achismo por achismo, desculpe a presunção, eu sou mais o meu, 
Na realidade, pode parecer muito óbvio, mas eu creio que a origem das chamadas, a princípio, está associada literalmente à falsidade de algum capoeira anônimo das antigas, que deve ter levado a pior em uma demanda. Daí, parou, abriu um sorriso, abriu também os braços, ou estendeu a mão, como quem estava reconhecendo a superioridade do outro e que do esse outro se aproximou pra corresponder ao abraço ou aperto de mão, foi pego de surpresa com algum golpe traiçoeiro e violento.
Isso deve ter virado o maior “bafafá” na época e fez com que tal recurso se consagrasse (pois, frequentemente, atitudes que “dão certo” se consagram facilmente. Tanto para o bem, quanto para o mal).
Agora vamos exercitar a imaginação:
Imagine se você fosse dessa época e tivesse presenciado uma cena como essa que eu acabei de citar. De repente, você se vê jogando com um cara sobre o qual você está levando nítida vantagem. De repente, ele pára, dá um sorriso, estende a mão ou abre os braços, num gesto de reconhecimento à sua superioridade. Eu pergunto: você cumprimenta ou não? E se cumprimenta, como o faz?....pois é. mais ou menos assim que eu entendo que esse fundamento se consagrou e, em um processo histórico que dura até o dia de hoje, vem sofrendo várias transformações na forma e no conceito.
Quer um exemplo? 
Vou tentar legitimar essa tese cruzando os dados com a Regional de mestre Bimba.
Eu considero que o que consagrou a criação de Bimba não foi a forma da luta em si, mas o fato dele ter tornado objetivo, concreto, lógico e racional tudo que a capoeira já oferecia desde sempre, só que de forma intuitiva, inconsciente, velada, subjetiva e subliminar. E o que a chamada de bênção tem a ver com isso?
Ora, o batizado da Capoeira Regional de Bimba, por exemplo, era quando  o aluno entrava pela primeira vez na roda de capoeira ao som do aço (e isso frequentemente acontecia em um dia de aula normal. Não era um evento como muitos imaginam, confundindo com o quê era formatura na CCFR).
Nesse contexto, o aluno que ia ser batizado, escolhia o padrinho que ia batizá-lo na roda e, ao final do jogo, esse aluno era orientado pelo próprio M. Bimba, a pedir a “bênção” pra seu padrinho. Daí o padrinho abria os braços como quem ia abraçar ou estendia a mão como quem ia cumprimentar seu afilhado e adivinha? (inclusive eu creio que é daí que advém o nome do chute que conhecemos por bênção bem como o termo “chamada de bênção”...mas daí, já é outra história)
Agora imagina as gerações se sucedendo na escola de Bimba….como pediam a bênção ao seu padrinho? (um comportamento bem similar, não?). Não estou dizendo que tem chamada de bênção na Regional, mas creio que foi a forma de m. Bimba encontrou para preservar esse fundamento que se consagrou em uma época que antecedeu a criação da Regional. E ele fez isso com todos os outros elementos. 
Bom….essa foi a forma mais resumida possível sobre a minha especulação sobre chamada...os desdobramentos e referências que eu tenho, dariam um livro…"
Achei particularmente sensacional a explicativa do mestre e mais uma vez o agradeço, assim como os demais que contribuíram com suas explicativas...axé e paz.

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