Mestre Bimba José Sisnando
“Os bons nascem prontos”
Não me esperem para a colheita. Estarei sempre a semear.
Ernesto Che Guevara
SISNANDO. “É A PEDRA FUNDAMENTAL DA CAPOEIRA REGIONAL”. (segundo mestre Decânio)
Se este cearense - José Sisnando de Lima, do Crato-CE, não tivesse cruzado com Bimba naquela tarde na carvoaria, com sua força descomunal de lutador, seria muito difícil a capoeira regional chegar onde chegou. Ele foi crucial neste processo da organização, sistematização de ensino e projeção da capoeira regional baiana. Ele foi a luva, Bimba a Mão, Ele a chave, Bimba a porta, Sisnando o rio, Manoel Bimba o oceano, este cearense foi a bússola e o mestre foi o barco, uma simbiose, uma simetria para esta arte-luta. Bimba vê em Sisnando uma grande oportunidade da expansão da sua luta regional. A subida da montanha também é a descida, falou Nietzsche.
Manoel Bimba dos Reis Machado criou a luta regional, lutou, bateu e venceu. Quem mandava era sempre ele, a última palavra era do grande mestre. José Sisnando de Lima que saiu de sua cidadezinha natal rumo à Bahia, com um sonho de ser médico e tinha juntado com seu “matulão” interesse pelas lutas, já treinava o jiu-jitsu, luta grega romana e outras, mas queria aprender capoeira. Sempre visitava as rodas de capoeira nos finais de semanas em Salvador. Morando numa pensão, lamentava por não ter encontrado o “verdadeiro mestre” de capoeira. Até que um dia ouviu de um cozinheiro: “vá aprender essa luta com um nego chamado Bimba (ainda não era o grande Mestre Bimba), lá no engenho velho de Brotas, doutorzinho”. Bimba um homem de quase 2 metros de altura que o Doutor o respeitou desde início, ai Bimba olha para ele de cima a baixo e faz aquela famosa afirmação: “ capoeira é coisa pra preto e não pra branco”. Bimba, então propôs um teste para o baixinho cearense: “se aguentar três minutos no colar de força eu lhe ensino”. Por ser muito forte e por ter vivenciado outras lutas ele passou pelo teste de desafio e começou ali uma grande amizade e uma trajetória inseparável para a solidificação da capoeira regional baiana.
Sisnando foi o primeiro aluno universitário do Bimba. Para o sábio Mestre Decânio tudo começa quando ele chega na Bahia. O cearense vendo a dificuldade de reconhecimentos, os preconceitos e a desvalorização por parte da sociedade baiana em relação a capoeira, buscou formas e batalhou muito em defesa desta nova luta criada pelo mestre Bimba. Sisnando e outros alunos começaram a aproximar Bimba dos universitários possibilitando uma maior aceitação social e organização da capoeira. O Cearense “arretado” abre o mundo acadêmico e a sociedade da Bahia meu rei para Mestre Bimba e sua capoeira criada no final da década de 20. “Mestre Bimba começa a ser convidado por boas famílias para ensinar aos seus jovens meninos capoeira, presumivelmente como defesa pessoal” (Decânio)
EM SUMA: SISNANDO É O CARA. E BIMBA O LUTADOR.
Com 3 pancadas derrubava tudo e todos, com sua luta “regioná”. COMEÇA AI A HISTORIA. A influência evolutiva deste capoeirista - médico cearense é incontestável para a capoeira regional, angola e contemporânea até hoje. Bimba é um divisor de águas, tempo e espaço para capoeira naquela época e até hoje não existe nada de novo na capoeira que se aproxime desta obra fenomenal de arte chamada LUTA REGIONAL NORDESTINA BAIANA. O que temos hoje, são só repetições, pantomimas, plágios e uma “nova roupagem” de se jogar capoeira... Pois os toques são os mesmos, sequência, golpes, e a roda é a mesma, somos todos geneticamente filhos do incomparável todo poderoso Bimba, que ainda é inspiração e água de beber... Analisando a capoeira atual: “quando o bicho pega na roda, o dênde esquenta, voltamos rapidamente para capoeira do Bimba em pé e de 3 pancadas, ponteira, asfixiante e arrastão.
” Existem comentários que na década de 30 Sisnando participou de uma história curiosa: Defensor do governo de Juracy Magalhães, então interventor federal do Estado Novo da Bahia e também cearense, escutou que um grupo de estudantes de jornalismo iria escrever contra o governo. Sisnando então, disse aos estudantes que ao acabarem de escrever iria ler a notícia e caso não gostasse iria rasgá-la. Dito e feito. Os estudantes ficaram revoltados, partiram pra cima dele e não se deram bem. Um jornal da época publicou que um estudante de medicina enfrentou vários estudantes de jornalismo em defesa do governo. “Pouco depois Juracy se tornou amigo de Sisnando, que passou a integrar sua guarda pessoal”. (ABIB)- Sisnando começa a ter influencias políticas na Bahia e aproveita para apresentar Bimba e a capoeira regional ao governador Juracy e o presidente Getúlio Vargas e é nesta época que ele consegue a permissão para que a capoeira tivesse autorização legal pra ser praticada e sair do código penal. Bimba tem mais tarde a primeira academia oficial de educação física para ensinar seu METODO DE CAPOEIRA REGIONAL no Brasil.
Com o passar do tempo, Sisnando e outros alunos do mestre começaram a ganhar espaço no cenário da capoeiragem baiana. A competência desse grande homem do Crato, cearense, nordestino e brasileiro Jose Sisnando de Lima, foi um momento histórico que desencadearia mudanças profundas no universo da capoeira até hoje. Com enorme acesso dos alunos em diversos setores na sociedade como a imprensa e o Estado a capoeira começa ser bem aceita. Bimba começa a viajar com seu grupo de alunos espalhando a Capoeira Regional por todo o País. Com essa união de forças a Capoeira Regional passa a ser aceita por seletos grupos sociais e conquistar prestígios na Bahia. Ninguém pode sobreviver sem uma utopia, salientou o Emil Michel Cioran. (1937).
Sisnando é homem digno de homenagens por parte de todos os capoeirista do Brasil e do mundo pelo seu trabalho e contribuição valorosa para formação faraônica da capoeira regional, na sistematização metodológica de ensino da luta regional, como também pela bravura de libertar a capoeiragem da marginalização, diásporas e rejeição social, e a colocar nos seios da sociedade baiana brasileira. Sisnando e Bimba já sabiam muito bem o valor que a capoeira tinha, pena que muitos capoeiristas e cearenses e brasileiros não sabem o valor que Sisnando tem na capoeira, não conhece e nem valoriza este nobre discípulo do Bimba: o homem que trouxe a luz e vento do Ceará para o dendê baiano.
Dr. José Sisnando Lima que depois formou-se pela Faculdade de Medicina de Salvador, tornando-se especialista em neuropsiquiatria, clinicou em Santa Bárbara seguindo depois para o sul do Ceará e norte de Minas. Retornou à Bahia e novamente em Santa Bárbara destacou-se pelos investimentos na agricultura o que lhe garantiu a presidência do Sindicato Rural de Feira de Santana. Foi também médico da Secretaria de Agricultura, supervisor estadual da Merenda Escolar e professor de Biologia. Eleito vereador em 1958, chegou à presidência da Câmara e nesta condição, substituiu o então prefeito Arnold Silva por quatro meses, no ano de 1962.
Atribui-se a esse capoeirista cearense a coragem de um lutador incansável em busca dos seus sonhos. E a coragem é a primeira das qualidades humanas. Um homem de coração valente não admite falsificação. Ele era um sujeito leal, honesto e verdadeiro com suas palavras, firme em seus passos e digno com suas ações. Sisnando era um homem “cabra da peste”, de atitudes, determinações e perseverança em busca dos seus objetivos, por isso chegou onde chegou.
Vamos congratulá-lo, respeitá-lo e parabenizá-lo pela sua grande contribuição na capoeira e colocá-lo no seu verdadeiro lugar de honraria na capoeira. "O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso, existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis." Fernando Pessoa. “A diferença fundamental entre o homem comum e o guerreiro, é que o guerreiro encara tudo como desafio, enquanto o homem comum encara tudo como bênção ou maldição”. Carlos Castañeda
SARAVA...
DADOS BIOGRÁFICOS
gentileza de seu filho Hildebrando “Kimura”
José Cisnando Lima nasceu em 9 de Outubro de 1914, no Sítio Santa Rosa, Crato/CE.
Ingressou na Faculdade de Medicina da Bahia em 1932 , formando-se em 1937.
Iniciou suas atividades profissionais em Sta. Bárbara/Ba.
Regressou à sua terra natal, em 1943, clinicando em varias cidades do sul do estado até 1950, quando retornou a Sta. Bárbara/BA.
Sonhador, empreendedor, apaixonado pela agricultura, trouxe colonos japoneses para incrementar as técnicas agrícolas em sua propriedade e foi pioneiro na irrigação das suas culturas, o que o conduziu à presidência do Sindicato Rural de Feira de Santana/BA.
Eleito vereador em Feira de Santana, foi líder do partido situacionista neste município.
Nomeado médico da Secretaria de Agricultura, foi requisitado paras a função de legista da Secretaria de Segurança Pública.
Exerceu os cargos de Supervisor Estadual da Merenda Escolar e representante federal da Campanha Nacional para a Merenda Escolar.
Eleito Presidente da Câmara Municipal de Feira de Santana, assumiu a Prefeitura local durante 4 meses por motivo de saúde do prefeito em exercício.
Dois anos depois dedicou-se inteiramente à psiquiatria, fundando duas clínicas particulares para doentes mentais.
Ensinou biologia no Colégio Santanópolis, no Instituto Guimarães e no Educandário da Casa São José.
Aprendeu Jiu-jitsu com Takeo Yano antes de chegar a Salvador.
Com Takamatsu, 5o dan da Shotokan e 2oda Kodokan, praticou e estudou o karatê.
Um dos seus colonos japoneses o iniciou em Kendô e Bojitsu.
A sua equipe de japoneses, oriunda da TakuDai, incluía Saito Masahiro, 2o dan pela Kodokan e 1o dan pela Shotokan, que ensinou Judô e Karatê no Spartan Gym de Dr. Geraldo Blandy Motta e no Gremio da Escola de Politécnica, com o qual também pratiquei as duas artes marciais.
Postagem da prof. Railda Santana e Mestre Chuvisco